domingo, 13 de março de 2011

Children´s and Young People´s Media in Africa - University of Westminster





Ontem, sábado 12/03, participei da conferência Children´s and Youg People´s Media in Africa na Universidade de Westminster. O evento foi realizado no campus da Marylebone Road que fica localizado ao lado do Regents Park em Londres. Participaram deste evento professores, pesquisadores, doutorandos e mestrandos daquela universidade e também de outras, principalmente do continente africano. O evento aconteceu em dois períodos do dia: pela manhã e à tarde, e contou com o seguinte formato.
Pela manhã, após as falas de abertura do Dr. Peter Goodwin, diretor de pesquisa da Escola de Mídia, Artes e Design e do Professor Colin Sparks, diretor do centro de pesquisa em mídia, ambos da Universidade de Westminster, ouvimos a Dra. Oluyinka Esan que é professora de mídia e estudos de cinema da mesma universidade. A professora apresentou um panorama crítico em relação à mídia direcionada ao público infantil e juvenil na África. Logo após teve lugar no evento uma grande mesa redonda que tratou do uso das mídias sociais nos protestos pró-democracia no Egito e na Tunísia. Desta mesa, participaram oito pesquisadores que discutiram as manifestações juvenis nas redes sociais, principalmente no Facebook e no YouTube em prol da democracia naqueles dois países.
Após duas paradas pela manhã para o chá e o almoço, servido à americana, os trabalhos da tarde tiveram início com uma outra mesa redonda, agora para discutir as perspectivas em torno da produção e distribuição de conteúdo televisivo nos países africanos. Participaram desta mesa-redonda quatro especialistas no assunto, entre eles da Dra. Maya Goetz que apresentou um trabalho bastante consistente em relação ao uso da mídia como ferramenta de comunicação para atingir o público jovem, principalmente as crianças. Em seguida, a conferência deu lugar para os trabalhos dos painéis temáticos. Foram três painéis: um que discutiu os efeitos da mídia na audiência juvenil na África, outro que tratou do tema das narrativas e conteúdos da mídia africana e, por fim, o terceiro que abordou o uso da mídia na educação das crianças e dos jovens africanos.
Participei deste evento depois de ter sido convidado pela profa. Jeanette Steemers que foi sua idealizadora. Tenho mantido contato com esta professora desde o ano passado por conta de meu conhecido interesse nos temas que circulam em torno da mídia, do consumo e da infância. Nossos contatos anteriores contaram com algumas trocas de e-mail e de indicações por parte dela de bibliografia a respeito do tema. Chegando a Londres contatei a professora que logo me convidou para assistir ao evento. Depois desta experiência pretendo repetir minha participação em outros organizados por aquela universidade que abordem o assunto, pois além de bem organizado contou com interessantes abordagens do tema que tanto me interessa.
Desde minha participação em maio de 2010, neste caso apresentando um trabalho ao lado da Profa. Gisela Castro, no evento e-Youth na cidade de Antuérpia na Bélgica, busco participar de eventos que tragam uma diferente visão a respeito da mídia e das crianças da que estou habituado a acompanhar em nosso país.
Os trabalhos apresentados nestes eventos trazem algumas saídas para a questão. A visão apenas apocalíptica da mídia não se mostra dominante. Há uma tentativa de compreensão dos fenômenos midiáticos e uma composição de como trabalhar a partir deles. Surgem algumas visões mais profundas e colaborativas na problematização do binômio infância-consumo. As demonizações do marketing e da publicidade, eleitos em nosso país como os únicos vilões dos problemas da infância não são os atores principais das discussões. São tratados como partes importantes, mas não únicas do sistema midiático. As questões envolvem um pensamento um pouco mais amplo, uma discussão em torno da cultura midiática como uma realidade no contexto mundial. A questão da regulamentação participa também das discussões, mas de forma também ampliada, não se restringe às proibições e censuras à publicidade.
O foco principal deste evento de ontem foi o conteúdo das peças midiáticas, principalmente da televisão e das redes sociais. Entendem a mídia como potencial aliada no processo de educação e circulação dos valores africanos. A TV é vista como importante ferramenta que pode servir para instrução, entretenimento e informação do público infanto-juvenil. Os pontos potencialmente negativos e preocupantes deste meio foram discutidos como contraponto de suas questões positivas. A grande preocupação dos africanos é a dominação massiva dos conteúdos norte-americanos em seus meios de comunicação, principalmente na TV. Mais de 60% dos conteúdos televisivos na África são de origem norte-americana. Segundo Melaine Stokes da Kindle Entertainment, participante da mesa da tarde, a questão não é julgarmos se a produção norte-americana é ou não de boa qualidade para as crianças e jovens, devemos discutir se é realmente pertinente para as crianças e jovens africanos um conteúdo com valores e identidades tão específicos, de uma cultura de um único país, mas que é circulada pelo mundo africano como se fosse a única opção. Será que faz senido um cultura tão específica dominar desta forma a produção de TV naquele continente? As produções norte-americanas são sedutoras e contam com um forte poder de entreter os jovens e as crianças. Vide seriados norte-americanos e desenhos animados produzidos naquele país. Qual brasileiro e, segundo o evento de ontem, africano que não conhece a Hannah Montana e o Ben 10? Quando perguntamos em aula o que os alunos assistem na TV, a grande maioria nos conta que os seriados norte-americanos são sua escolha principal, confirmando a preocupação do evento de ontem.
A profa. Esan trouxe como premissa para sua apresentação o seguinte: "The African child needs to be prepared for the competition in the Global Arena." Para Esan, as crianças precisam ser respeitadas como cidadãs e serem atores ativos no dia-a-dia social. Estas desejam programas de boa qualidade que agucem suas competências intelectuais e que as respeitem em suas vulnerabilidades, mas que também saibam trabalhar com suas habilidades e competências. Nesta linha de pensamento, a mídia africana pode ser utilizada como potente aliada no processo de transmissão de valores como pertencimento, respeito, proteção e participação da criança e do jovem no contexto social. Um número alarmante mostrado pela professora está ligado aos personagens infantis, mais de 90% dos personagens que circulam pela TV da África negra são de cor de pele branca. Este tipo de preocupação é pertinente na medida em que se a ideia é utilizar uma TV que apóie a transmissão dos valores africanos, o processo já tem início de forma inviezada. Como transmitir valores através de personagens de quase impossível identificação étnica com as crianças?
A mesa redonda que aconteceu após a fala da professora Esan, mostrou alguns exemplos e discutiu diferentes formas de manifestação política dos jovens egípcios e de outros países da África nas mídias sociais como YouTube e Facebook. Nestes websites, são postados materiais com conteúdos políticos, principalmente, em favor do estabelecimento de processos mais democráticos naqueles países. Os materiais são pró-revolução contra os regimes políticos vigentes. Trazem conteúdos agressivos e em formato mais inteligível para os jovens através de uma linguagem adaptada ao contexto da internet.
Iniciamos a tarde com a mesa-redonda que se propôs discutir o tema da produção de conteúdos televisivos. Foi nesta mesa que veio à tona a questão da dominação excessiva das produções norte-americanas que trazem valores de uma sociedade com uma realidade distante da africana. Segundo Sophie Chalk, produtora de conteúdo de TV, o segredo de um bom conteúdo está nos escritores e não apenas nos diretores. Para esta especialista em produções televisivas, deve-se investir mais nos escritores e roteiristas que nas produções. Os conteúdos que realmente se mostram relevantes, pertinentes e inovadores para o continente africano trazem fortes roteiros e criativas histórias pensadas pelos escritores locais. A identidade africana precisa ser preservada nestes conteúdos de TV e deve ser adaptada à linguagem infanto-juvenil para se poder fazer frente às sedutoras produções norte-americanas.
A realidade da TV brasileira não se mostra tão diferente da africana. Também apresentamos a mesma dominação de conteúdos norte-americanos com um agravante que é a desvalorização das características identitárias de nosso país por parte dos jovens. Nossas crianças e jovens identificam-se mais com atores, personagens e histórias criadas neste contexto específico demais para dominar tanto como é a cultura norte-americana. Um evento como o de ontem serviu para os intelectuais africanos se mexerem, repensarem suas questões identitárias, questionarem suas produções midiáticas e como estas equacionam seus valores. Um evento como este também serviria para nós brasileiros. Independentemente de resultados práticos pós-evento, ontem era notória a movimentação intelectual que a iniciativa causou. Intelectuais daquele continente em conjunto com pensadores de outros países juntos para dicustir suas produções midiáticas focadas para seus jovens.
Sinto falta em nossas produções acadêmicas de discussões em torno de nossas produções midiáticas focadas no público infanto-juvenil. As questões em torno da infância e da mídia ainda trazem sempre um tom apocalíptico que não nos permite seguir em frente. O investimento, incluindo premiações públicas, apenas em pesquisas que criticam e acusam o marketing e a publicidadade como causadores dos males da infância, não nos permite seguir em frente, discutir temas mais profundos em torno da mídia e do mundo infanto-juvenil. Temas como o cyberbulling, a dominação de conteúdos norte-americanos na audiência infanto-juvenil no Brasil, as produções "políticas" de nossos jovens nas redes sociais, entre outros temas, são urgentes e precisamos, de algumas forma, dar conta delas.

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